quarta-feira, 21 de setembro de 2005

Inacabado

Desperdício: ato ou efeito de desperdiçar; esbanjamento; uso sem proveito; perda; todas as coisas que não se aproveitam...

Casualmente ela abriu o dicionário e estava lá. Desperdício - substantivo masculino. E como era habitual, mudou de órbita por alguns instantes. Aquelas palavras, até então somente no papel, agora ecoavam nos seus pensamentos. Sem proveito! Perda!! De tempo, de energia, de palavras, de sentimentos, de atenção, de desejos, de muita coisa - suspirou pensando no que vinha passando nos últimos tempos.

Deveria ser proibido por lei desperdiçar tudo isso - imaginou. Chegou a pensar que o governo - ou sei lá quem - deveria baixar uma Portaria proibindo que qualquer pessoa dedicasse um minuto que fosse da sua energia a quem não demonstra o menor interesse em retribuir. Como no apagão! Todo mundo foi obrigado a economizar energia. Na vida, deveria ser igual - pensou.

Os mais românticos, falam que o bom mesmo é gostar, dedicar-se a alguém e se entregar. Já fui assim - lamentou. E foi honesta reconhecendo que talvez no dia seguinte, ou mesmo em algumas horas, voltaria a ser exatamente do mesmo jeito. Mas naquele exato momento em que abriu o dicionário, sentia-se uma esbanjadora de atenção e sentimento a quem não dá a mínima.

Imaginou-se jurando nunca mais fazer isso. Ela, que acreditava, sobretudo no poder das palavras, chegou a colocar a mão sobre o dicionário. Estava quase se levantando e proferindo um juramento, quando voltou a si e lembrou que nesse ponto, era totalmente impotente. De repente, é aquela voz, aquele jeito, aquela cor, aquele cheiro, e pronto! Esqueço tudo e lá vou eu oferecer assim de graça o que tenho de mais honesto dentro de mim mesmo sabendo que não vem nada de volta! – concluiu.

Recomeçou então o que estava fazendo. Mas vez em quando, se perdia em pensamentos novamente. Como se lembrasse de um filme tantas vezes visto e revisto, via-se se derretendo em atenção e suspiros a alguém em outra sintonia.

Talvez um dia ela mude. Ela, aliás, aprendeu na Antropologia que o ser humano é inacabado. Em constante mutação. Desde que se deu conta disso, já não se sentia tão mal por não saber direito quem era. Mas naquele instante, a única coisa que conseguia repetir pra si mesma era: Esta sou eu! Talvez se justificando, ou quem sabe, se lamentando... Quem poderia saber?

2 comentários:

Anônimo disse...

Dani,

adoro seu blog, leio sempre e me identifico muito com as histórias ou "estórias", sei lá, que vc escreve.

eu tb disperdicei meu tempo com quem não merecia meu carinho e fico analisando por que não consigo me livrar de situações assim...

enfim, quem sabe um dia a gente toma uma vacina contra esse tipo de gente e conseguimos gastar nossa energia com coisas mais importantes.

Abração.

Dani Marques disse...

"Anônimo"...
Talvez o segredo seja não perder o jeito, sabe? Se doar é necessário. Se vc gosta, se doa. Não dá pra ser diferente. Mas o negócio é saber pra quem se entregar, né? Amor é muito legal. E só se realiza assim - qdo a gente tem coragem e se joga mesmo. Acho que até isso que assusta. Nem todo mundo é valente o bastante pra amar e muitos não o são sequer pra se deixar amar.
Mas também não dá pra ir contra nossa natureza. Quanto a mim, acho que vou começar a tentar ser mais honesta com que o vejo, fantasiando menos. Mas entregando sim - e de bandeja - todo o amor que carrego aqui dentro a quem for digno dele. O que eu tenho pra oferecer é valioso demais, o outro tem que demonstrar que merece!
É isso...
Obrigada por "me ler" e apareça sempre.